quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Os Bares da Estação Ferroviária

Neste espaço, onde tento fazer valer o expressão "reminiscência", que dá nome à coluna, alguns textos atrás registrei a lembrança de bares noturnos que conheci e freqüentei, nos meus primeiros vinte anos, bem vividos na cidade de Ourinhos.

Acabei cometendo, dentre outros equívocos costumeiros, uma sandice com os bares então existentes na estação ferroviária. Eram dois. Um, que pertencia ao senhor Lourdes (lembro apenas do sobrenome do comerciante), dotado de instalações sofisticadas, incluindo área de restaurante. O outro, pertencente ao "Toninho", homem sisudo, cara de poucos amigos, se restringia a um quiosque, montado entre a plataforma da antiga Sorocabana, onde aportavam os trens chegando ou partindo para a Capital e a gare que abrigava os trens da então Rede Ferroviária São Paulo-Paraná-Santa Catarina.

Entre a chegava e a partida dos trens de passageiros, os dois estabelecimentos eram muito concorridos. Percebia-se que o pequeno Bar do Toninho atendia um público mais simples, certamente com menor poder aquisitivo, buscavam muitas vezes apenas por um café quente - ou uma boa dose de conhaque, dos mais comuns - que lhes permitissem aplacar o cansaço ou o enfado de uma viagem sem fim ou amenizando a fome ao consumir pastel oferecido em bandejas ou cesta de vime, em geral atendia homens viajando sozinhos.

Enquanto isso, o Bar do Lourdes, com seus balcões de mármore, oferecia lanches quentes, café com leite - o cheiro do churrasquinho na chapa, levado pela fumaça, tomava as áreas subjacentes - atendendia as famílias com mais conforto e serviço de qualidade.

Uma curiosidade, o Bar do Lourdes também atendia o público externo da ferrovia - essa área permitia que os notívagos dele se socorressem durante toda noite, incluindo a madrugada - quando não existia outra opção até mesmo para comprar cigarros, quiçá para o aperitivo ou lanche.

Quantas noites e madrugadas, debaixo de chuva ou sob frio insuportável, acompanhei meu pai e/ou meus irmãos entregando carne ao restaurante dos trens de passageiros (N.2, N.5...). Hoje esse serviço seria tratado como delivery - se resumia a atender encomendas, feitas através de telegrama nos horários mais incomuns, com a informação de atrasos ou situações não previstas na viagem - que se resumia no reabastecimento de víveres para o preparo de pratos servidos para passageiros ávidos por uma boa refeição.

Como se pode perceber a ferrovia, em cujo entorno vivemos por décadas; permite o registro de seus personagens mais ilustres - como o chefe da estação, exibindo autoridade através do quepe vermelho, telegrafista, feitor das turmas e fiel do armazém; - outros em atividade mais simples - como os "truqueiros", cujo ouvido privilegiado permitia distinguir o som da batida no depósito de ar das composições, detectando eventuais avarias que pudessem comprometer a viagem: além dos amplos espaços - existentes em seus páteos onde brincávamos livremente quando crianças e na adolescência - haverão de reservar boas lembranças para nossa "reminiscência".

Nenhum comentário:

Todos os direitos reservados.