domingo, 23 de agosto de 2009

Um playboy orinhense

Sua figura franzina, alquebrada pelo cigarro e consumo excessivo do álcool – certamente teve acesso a outros tipos de drogas – aliada à decadência econômico-financeira de sua família, já não permitiam vislumbrar a intensidade da vida de Antônio Carlos Barbosa. Naquela altura, apenas o cavalo baio, seu animal de estimação, que insistia em manter no quintal da residência, ainda atendia sua vontade.

Mesmo nos dias de hoje, ficava difícil imaginar, em uma cidade do interior – bem provinciana, como era Ourinhos nas décadas de 40 e 50 – encontrar um personagem como Antônio Carlos. Seus pais, Oscarlino e Emília, empresários de sucesso, foram donos do Bar e Restaurante Central e depois de uma Panificadora na avenida Jacinto Sá – como era costume, fizeram todas as vontades do único filho homem, ainda tiveram duas filhas.

Apesar de não formado – situação comum em jovens daquela época - demonstrava razoável cultura, indicando que estudara em boas escolas. Exibia excelente caligrafia e facilidade em escrever e discorrer sobre os mais variados assuntos – quando sóbrio, falava com desenvoltura e rico vocabulário. Gostava de exibir fotografias montado em sua potente motocicleta - daquelas que traziam bolsas de couro nas laterais. Com outros jovens ourinhenses, integrou as primeiras turmas de pilotos formados pelo Aero Clube de Ourinhos – talvez tenha sido um dos seus fundadores.

Por certo a boemia foi sua principal ocupação. Freqüentador fiel da noite ourinhense – existiam bons bares noturnos e invariavelmente as noites terminavam na zona do baixo meretrício – percebia-se claramente que "Toninho Pinguinha", como passou a ser chamado, nunca trabalhou, nem mesmo na panificadora da família, apesar de não desconhecer os segredos do comércio e fabricação de pão.

Em minhas lembranças, Antônio Carlos já não possuía mais motocicleta, tampouco aventurava-se a pilotar e nem mesmo freqüentava o Aero Clube. Raramente saía para cavalgar em seu cavalo "Baio". Mas, quando o fazia, apresentava paramentado de polaina, bota e rebenque. A sua montaria era elegante, em posição ereta e altiva ocupava a impecável sela trabalhada em couro, onde se destacavam os estribos prateados. Ao final da cavalgada, apeava defronte o estabelecimento comercial e num movimento enérgico com o rebenque ordenava e seu cavalo se afastava em direção à cocheira – dobrando a rua Gaspar Ricardo, alcançava a porteira do quintal.

Mesmo debilitado, manteve-se na boemia. Já não dispunha de recursos ou disposição física para as noitadas. Ainda assim, o notívago mantinha-se fiel aos seus princípios. Em geral levantava-se depois do almoço e logo depois era encontrado ocupando uma mesa do Bar do Toloto diante de seu "traçado" predileto – mistura de aguardente com Undemberg, substância amarga e de cor escura – que ingeria pacientemente, sem pressa, ainda preservando algum requinte.

Salvo quando discutia com seus pais, momentos que lhes atribuía culpa pelo seu desatino – situação comum em muitas famílias - Antônio Carlos era incapaz de proferir palavras de baixo calão ou comportar-se de modo inconveniente perante alguma senhora – as crianças o adoravam pelas brincadeiras ingênuas ou provocações, Luizinho Tanaka era uma das suas vítimas, talvez por perceber suas birras infantis, já que éramos todos vizinhos.

Mais adiante, após vender a panificadora, o senhor Oscarlino manteve-se exclusivamente na condição de cotista da Cervejaria Brahma – lembro que as garrafas chegavam embaladas individualmente revestidas em palhas e acondicionadas em sacos de linhagem - e responsável por sua distribuição na cidade. Essa atividade teve continuidade nas mãos do seu cunhado – o admirado e respeitado capitão Benedito – depois provedor da Santa Casa local.

A família mudou-se então para a rua Gaspar Ricardo, depois da rua Amazonas, e o nosso playboy encerrou os seus dias, sem perder a postura e o bom humor, tomando a sua mistura no Bar do Tanaka – onde também se degustava o melhor sorvete de Nata do mundo - e, quando encontrava algum ouvinte, certamente discorria sobre suas aventuras da juventude.

Ao contrário de outros playboys, como foi o carioca Jorginho Guinler, o ourinhense Antônio Carlos, por discrição ou pudor, não falava de suas aventuras amorosas e também não se gabava das belas mulheres que conheceu!

Talvez seus contemporâneos possam fazê-lo!

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